Nos próximos dez anos, o Brasil deverá experimentar um crescimento significativo na oferta de biocombustíveis, conforme os estudos recentemente divulgados pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). O Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2034, publicado em setembro de 2024, traz projeções que destacam o papel central do país na transição energética global. Segundo o estudo, a oferta de etanol, biodiesel e outros biocombustíveis deverá crescer de forma robusta, contribuindo para a diversificação da matriz energética e a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
De acordo com as projeções, a oferta de etanol, derivado da cana-de-açúcar e do milho, pode alcançar 48 bilhões de litros em 2034, o que representaria um aumento médio anual de 3,8% em relação a 2022. A demanda por etanol combustível, por sua vez, deverá ser de 45 bilhões de litros, garantindo um balanço positivo para todo o período. O uso de etanol, especialmente no setor automotivo, será impulsionado pela maior competitividade do hidratado em comparação com a gasolina, além de incentivos provenientes do programa RenovaBio, que visa a promoção de biocombustíveis no Brasil.
O estudo também apresenta estimativas para a produção de bioeletricidade a partir da cana-de-açúcar, biogás, biodiesel e diesel verde. A energia gerada a partir do bagaço de cana, por exemplo, pode atingir uma capacidade de 5,8 gigawatts médios (GWm) até 2034. Essa capacidade poderá ser ampliada se houver a utilização de outros resíduos da cana, como palha e ponta, ampliando a participação da biomassa na matriz elétrica brasileira.
Um dos destaques do estudo é o potencial de produção de biogás, que poderá chegar a 6,4 bilhões de metros cúbicos normais (Nm³) até 2034, principalmente a partir de resíduos do setor sucroenergético, como vinhaça e torta de filtro. Este volume, quando convertido em biometano, seria suficiente para atender a 17% da demanda de gás natural do Brasil em 2023. O biometano se apresenta como uma alternativa viável e estratégica para reduzir as emissões do setor de transporte e contribuir para a transição energética.
Em relação ao biodiesel, a produção deverá seguir os percentuais de adição ao diesel fóssil conforme estabelecido pela legislação. O percentual de biodiesel no diesel B, atualmente em 15%, pode resultar numa demanda de 13,6 bilhões de litros até o final do período. O óleo de soja permanece como a principal matéria-prima, com expectativa de manter sua liderança na produção de biodiesel, embora outras fontes, como o óleo de fritura e de palma, também estejam crescendo.
O estudo também destaca o papel emergente dos combustíveis sustentáveis de aviação (Sustainable Aviation Fuels – SAF), que serão cruciais para o cumprimento das metas de redução de emissões da aviação comercial. A produção de SAF no Brasil, prevista para atingir 1,1 bilhão de litros anuais em 2034, será essencial para atender às exigências internacionais, como o esquema de compensação e redução de carbono da aviação civil internacional (CORSIA). O CORSIA, que será obrigatório a partir de 2027 para os países signatários, exige que as emissões internacionais acima dos níveis de 2019-2020 sejam compensadas com créditos de carbono ou com o uso de combustíveis sustentáveis.
Além de SAF, o estudo do PDE 2034 discute as oportunidades para o diesel verde e outros biocombustíveis, como o HVO (Óleo Vegetal Hidrotratado), a bionafta e o bioGLP. O Brasil tem a oportunidade de se posicionar como líder global na produção e exportação desses combustíveis, aproveitando sua vasta experiência na produção de etanol e biodiesel.
O documento também menciona inovações tecnológicas, como a captura e armazenamento de carbono em bioenergia (Bio-CCS), que pode reduzir ainda mais a intensidade de carbono dos biocombustíveis. Essas tecnologias serão fundamentais para garantir que o Brasil alcance suas metas climáticas e contribua de maneira efetiva para a redução das emissões globais de GEE.
Programas de governo, como o RenovaBio, o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) e o projeto de lei Combustível do Futuro, são apontados como essenciais para o desenvolvimento sustentável dos biocombustíveis no país. Essas políticas públicas oferecem incentivos econômicos e fiscais para o setor, promovendo a competitividade e a inovação tecnológica.
Ainda segundo o estudo, a diversificação regional da produção de biodiesel será fundamental para garantir a sustentabilidade do setor. O incentivo a culturas adaptadas às condições climáticas das regiões Norte e Nordeste poderá aumentar a produção nessas áreas, reduzindo as desigualdades regionais e promovendo o desenvolvimento econômico local.
Outro ponto crucial abordado é o mercado internacional. O Brasil, sendo um dos maiores exportadores de biocombustíveis do mundo, desempenhará um papel importante no abastecimento global. As exportações líquidas de etanol e biodiesel devem continuar crescendo, principalmente para países como Estados Unidos, União Europeia e China, que possuem políticas de incentivo ao uso de energias renováveis.
Por fim, o PDE 2034 enfatiza a importância de um planejamento estratégico de longo prazo, que leve em consideração as demandas globais por energia limpa e as necessidades internas do Brasil. A transição para uma economia de baixo carbono será desafiadora, mas o Brasil está bem posicionado para liderar essa transformação, graças à sua capacidade produtiva e à riqueza de recursos naturais.