Nos últimos anos, a transição energética mundial tem ganhado formas concretas, e depois da consolidação da energia solar na década passada, o biometano desponta como protagonista da nova era, especialmente no Brasil. Gás renovável produzido a partir da decomposição de resíduos agrícolas, urbanos e industriais, o biometano é reconhecido não apenas por seu potencial de descarbonização, mas também por sua função de integrar energia, indústria e economia circular em um ciclo virtuoso com impactos sociais, ambientais e econômicos.
Biometano: definição, produção e impacto ambiental
O biometano é um combustível produzido pela purificação do biogás, que surge da decomposição anaeróbica de matérias orgânicas como resíduos agrícolas, resíduos urbanos sólidos, resíduos industriais e efluentes orgânicos. Ao contrário do gás natural fóssil, o biometano tem origem renovável e pode reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Um dos grandes benefícios ambientais do biometano é a mitigação das emissões de metano, um dos gases de efeito estufa mais potentes, com um impacto global 28 vezes maior que o do dióxido de carbono (CO₂). Ao capturar e utilizar esse metano, as emissões que seriam liberadas na atmosfera são convertidas em energia limpa, evitando seu impacto climático.
No Brasil, o potencial técnico de produção de biometano é expressivo. Segundo dados da Associação Brasileira de Biogás (ABiogás), o país pode substituir até 70% do consumo atual de diesel, especialmente no transporte pesado e no agronegócio, setores que tradicionalmente dependem fortemente de combustíveis fósseis. A coproduction of biometano utiliza materiais residuais que, se não aproveitados, poderiam gerar passivos ambientais significativos, reforçando a conexão do biometano com a economia circular.
Expansão do mercado e avanços regulatórios
O setor de biometano no Brasil está em franca expansão. Estudos recentes indicam que a produção nacional poderá crescer mais de 215% até 2027, saindo dos atuais 656 mil metros cúbicos por dia para cerca de 2,3 milhões m³/dia. O estado de São Paulo concentra atualmente cerca de 40% da produção nacional e lidera os projetos de expansão, onde o biometano pode substituir até 85% do diesel consumido no setor de transporte pesado, reduzindo mais de 90% das emissões de CO₂ equivalentes.
Este crescimento tem sido catalisado por um avanço significativo no marco regulatório brasileiro. Desde setembro de 2025, está em plena implementação o Decreto nº 12.614/2025, que regulamenta a Lei nº 14.993/2024 e integra o programa chamado “Combustível do Futuro”. Este programa não apenas institui incentivos para a produção e uso do biometano, mas também estabelece um mercado regulado com metas obrigatórias. Destaque para a criação do Certificado de Garantia de Origem do Biometano (CGOB), instrumento fundamental para rastrear a produção, assegurar transparência e permitir a negociação de créditos de descarbonização.
Além disso, a consulta pública do Ministério de Minas e Energia (MME) está em andamento para definir metas iniciais de aquisição de biometano para 2026, um passo chave para calibrar preços, garantir oferta suficiente e estimular investimentos na infraestrutura necessária. Paralelamente, o Projeto de Lei nº 2.647/2022, que tramita no Congresso Nacional, recebeu emenda para incluir o biogás e biometano como diretrizes prioritárias para incentivo às energias renováveis, especialmente no meio rural, a fim de fortalecer a agricultura familiar e promover a bioeconomia.
Biometano e economia circular: um ciclo sustentável
O biometano representa um elo simbiótico entre energia e economia circular. A produção do gás a partir de resíduos orgânicos urbanos, agrícolas e industriais transforma o que seria um passivo ambiental em ativo econômico e energético.
Esse modelo gera um ciclo fechado: resíduos coletados são encaminhados a unidades de tratamento que transformam matéria orgânica em biogás. Após purificação, o biogás vira biometano, que pode ser usado para abastecer veículos, gerar eletricidade ou alimentar processos industriais, reduzindo dependência de combustíveis fósseis e fechando o ciclo de reaproveitamento dos resíduos.
Exemplo prático dessa circularidade foi implantado no Rio de Janeiro, onde a Comlurb substituiu parte da frota de carretas movidas a diesel pelo biometano produzido justamente dos resíduos urbanos coletados, reduzindo em até 99% as emissões de gases poluentes emitidos por esses veículos.
Impacto econômico e oportunidades para a indústria
Além dos benefícios ambientais, o biometano oferece oportunidades relevantes para a indústria e para a economia nacional. O aumento da produção estimulado por políticas públicas reflete diretamente em geração de empregos e investimentos em tecnologia e infraestrutura.
Estudos estimam que o crescimento da produção de biometano pode gerar cerca de 20 mil empregos somente no estado de São Paulo até 2027. Além disso, grandes empresas já têm demonstrado interesse no segmento, integrando créditos de carbono e buscando ações que impactem positivamente suas pegadas ambientais.
A indústria brasileira, ao aproximar-se do biometano, ganha um vetor estratégico para sua transição energética, contribuindo para a competitividade e redução dos custos operacionais. O biometano se apresenta como solução para descarbonizar segmentos de difícil transformação, como transporte pesado, agricultura e processamento industrial.
A segurança energética como desafio e oportunidade
Ao substituir combustíveis fósseis importados, o biometano fortalece a segurança energética do país. Atualmente, o Brasil consome cerca de 65 bilhões de litros de diesel por ano, com mais de 20% desse volume vindo da importação. Com o aproveitamento de apenas 20% do potencial técnico de biometano na próxima década, seria possível reduzir em metade a dependência externa do diesel, diminuindo vulnerabilidades a oscilações de mercado e crises geopolíticas.
A infraestrutura já existente de gasodutos, postos de abastecimento e centros de produção de biogás proporciona uma base sólida para a integração do biometano na matriz energética nacional, facilitando a logística e reduzindo os custos.
Panorama futuro e desafios
Mesmo com o cenário promissor, o setor de biometano ainda enfrenta desafios. Destacam-se a necessidade de ampliar a infraestrutura de distribuição, a competitividade do preço em relação a combustíveis fósseis e a ampliação da oferta sustentável de matéria-prima.
Para isso, o diálogo entre setor público, indústria, produtores rurais e consumidores é fundamental para aprimorar mecanismos regulatórios, garantir incentivos adequados e fomentar tecnologias que aumentem a eficiência da produção.
O Governo federal, por meio do Ministério de Minas e Energia, tem desenvolvido consultas públicas e promovido debates para ajustar metas e políticas, buscando um equilíbrio entre desenvolvimento do mercado e garantia de competitividade.
A década que se inicia tem, portanto, no biometano um motor essencial para a transição energética brasileira. Em sua essência, o biometano representa mais do que um combustível renovável; simboliza a integração sustentável entre energia, indústria e economia circular, trazendo benefícios ambientais expressivos, fomentando a inovação tecnológica e reforçando a segurança e autonomia energética nacional.





