No contexto global, a pauta da sustentabilidade e da eficiência energética tem ganhado força incontestável, deixando de ser mera agenda ambiental e assumindo papel central na estratégia econômica, energética e social dos países. Para investidores institucionais, gestores públicos e imprensa especializada, entender os vetores que impulsionam a economia verde é condição fundamental para posicionamento estratégico, mitigação de riscos e identificação de oportunidades de investimento.
No Brasil, esse movimento recebeu impulso com o Plano de Transformação Ecológica (PTE), anunciado em dezembro de 2023 durante a COP28 em Dubai. O PTE, também chamado “Novo Brasil – Plano de Transformação Ecológica”, estabelece políticas públicas e ferramentas estratégicas para setores como energia, finanças, indústria e infraestrutura, com objetivos de descarbonização, inovação tecnológica e justiça social.
1. O contexto global: atrasos, ambições e oportunidades
Segundo discurso recente da ONU, o setor de energia limpa já emprega cerca de 35 milhões de pessoas no mundo, superando os empregos vinculados a combustíveis fósseis. Isso reforça que a transição energética não é uma meta futura, mas realidade em plena execução.
Contudo, ainda há desafios: estudos da ONU indicam que apenas 35% das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão em ritmo adequado de implementação global. No Brasil, entre 2023 e 2024, apenas 12 de 169 metas tiveram desempenho considerado satisfatório — sinal de que avanços estruturais permanecem lentos.
Apesar desses obstáculos, há razões para otimismo. Projeções para o Brasil indicam que a implementação do PTE pode gerar até 2 milhões de empregos e elevar o PIB em 0,8 ponto percentual ao ano até 2035. Outros estudos apontam impacto potencial de R$ 396 bilhões no PIB até 2030 com medidas verdes e modernização de infraestrutura.
Esse contexto evidencia um contraste: o mundo e o Brasil caminham com metas ambiciosas, mas enfrentam gargalos institucionais, regulatórios e de execução — e esses é que definem vencedores e retardatários na nova era verde.
2. Eficiência energética como motor estratégico
A eficiência energética atua como alavanca para transformar recursos escassos em vantagem competitiva. No Brasil, o Atlas da Eficiência Energética 2024, da EPE, mostra indicadores de evolução do consumo de energia elétrica por setor e aponta oportunidades claras de redução de perdas.
Em prédios públicos e indústrias, já há experiências que demonstram economias substanciais ao substituir equipamentos antigos por versões mais eficientes, otimizar processos e automatizar controles. Municípios têm investido em iluminação pública eficiente, sistemas de climatização inteligentes e certificação verde de edificações.
Além disso, cidades que promovem políticas de mobilidade elétrica, frotas públicas elétricas e incentivos à construção sustentável (certificações LEED, AQUA, EDGE) fortalecem seu perfil de sustentabilidade e atraem capitais com viés ESG.
3. O papel das empresas: do ESG à operação sustentável
Empresas modernas incorporam o desenvolvimento sustentável como vetor estratégico. Essa transição vai além de declarações públicas — exige decisões operacionais sobre uso de energia, água, resíduos e emissões.
Não é raro encontrar fábricas zero efluentes, unidades que reutilizam água e reciclam resíduos de processo ou embalagens. Algumas corporações já geram parte da energia consumida internamente por meio de painéis solares e adotam práticas de logística reversa.
Essas escolhas geram valor de longo prazo: redução de custos operacionais, preparação para normas ambientais, fortalecimento da reputação junto ao mercado e alinhamento com exigências de investidores ESG. Em muitos casos, investidores exigem relatórios transparentes que sigam padrões como GRI, SASB e TCFD — e o Brasil avançou nessa direção ao incorporar, via CVM, padrões da IFRS/ISSB a partir de 2026.
A gestão racional de recursos hídricos também é cada vez mais estratégica, especialmente em regiões que enfrentam crises de abastecimento. Empresas que investem em reuso de água ou proteção de bacias reduzem risco operacional e demonstram compromisso com a resiliência climática.
4. O PTE como alavanca para o crescimento verde
O PTE estrutura-se em seis eixos temáticos: financiamento sustentável, desenvolvimento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e infraestrutura/adaptação ao clima.
Entre as medidas previstas estão:
- Criação de mercado de carbono (com sistema cap-and-trade) e imposto de carbono.
Serviços e Informações do Brasil - Emissão de títulos verdes soberanos e estímulo à emissão de títulos corporativos temáticos.
- Incentivo a crédito competitivo para inovação e descarbonização, por meio do Fundo Clima e instrumentos setoriais.
- Compra pública de inovação para tecnologias verdes, com foco em P&D e em produção local com conteúdo nacional.
- Apoio à economia circular e reciclagem, reduzindo o descarte e melhorando a gestão dos resíduos.
- Projetos de infraestruturas verdes e adaptação climática (resiliência urbana, obras públicas com foco climático).
Já há movimentações concretas: o governo federal captou cerca de US$ 2 bilhões em uma primeira emissão de títulos verdes no exterior. Também promovem-se missões internacionais para atrair investidores, como recente visita do Brasil à Alemanha para apresentar o PTE a entidades financeiras e empresas.
Além disso, o balanço do PTE indica que o governo espera expandir o PIB, reduzir emissões de CO₂ e elevar a renda dos mais pobres com ações conjuntas. Uma simulação do Green New Deal Brasil prevê que o PTE pode induzir até R$ 1,3 trilhão de expansão do PIB até 2050, redução de 1 gigatonelada de CO₂ por ano, criação de 9,5 milhões de empregos e arrecadação adicional de R$ 121 bilhões em tributos.
5. Desafios críticos e riscos estratégicos
Embora promissor, o PTE enfrenta desafios importantes:
- Implementação e coordenação: são mais de cem medidas previstas, cada uma com prazos e recursos distintos; há risco de descontinuidade política ou falta de integração entre ministérios.
- Financiamento e custo de capital: a transição exige elevado investimento e acesso a crédito verde acessível.
- Capacidade institucional e técnica: estados e municípios carecem de estrutura para executar projetos verdes em escala.
- Riscos regulatórios e jurídicos: mudanças de regras, insegurança jurídica e resistência de setores tradicionais podem retardar avanços.
- Desigualdade territorial: o plano precisa reduzir desigualdades regionais, especialmente entre Norte, Nordeste e regiões metropolitanas — o que demanda ações específicas de compensação e apoio.
- Mensuração e prestação de contas: a transparência na execução e na mensuração de resultados será essencial para manter confiança de investidores e sociedade.
Conclusão
A sustentabilidade, a eficiência energética e a economia verde deixaram de ser aspirações para se tornarem peças centrais da estratégia nacional e global. No Brasil, o Plano de Transformação Ecológica representa a ambição de reorientar crescimento, inovação e desenvolvimento com base em princípios climáticos e sociais.
Para gestores públicos, investidores e o setor energético, a oportunidade é clara: quem souber converter intenção em execução — com foco técnico, disciplina regulatória e visão de escala — estará posicionado para liderar a nova fase da economia brasileira.